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sexta-feira, 1 de fevereiro de 2019

[0043] Tchalé Figueira, sob o signo do fantástico

TCHALÉ FIGUEIRA, Mindelo, São Vicente de Cabo Verde, 1953
De novo, Tchalé Figueira esgaravata o fantástico e, de Cabo Verde, envia-nos mais um conto em forma de fábula.


FÁBULA LOUCA

Morriam as vacas de fome, as tartarugas, saindo de mar, foram ao parlamento... Interditadas por gorilas, não conseguiram  reclamar na assembleia de hienas seus direitos. Hienas, bichos ignóbeis e pestilentos, sempre ocupadíssimos em peidar-se pela boca em discursos malcheirosos de rasgada gramática de bichos. 

Zangadas, as tartarugas foram-se queixar nas nações unidas da bicharada dos seus direitos. O urso-mor das nações unidas, amedrontado pelo rei leão do Norte, meteu-se na sua toca, e, numa crise de amnésia propositada, dormiu com os olhos abertos, mas sempre de esguelha, observando bando de chacais vampiros bebendo sangue de animais constantemente assassinados no reino animal. 

Aflitos, os sobreviventes saíram pelas ruas da selva protestando, mas foi a grande macacada!... Num relâmpago, veio a polícia e também soldados da guarda pretoriana do rei da selva distribuindo mordeduras com afiados dentes... Criou-se uma ditadura, a harmonia no reino animal extinguiu-se por completo: lobos disfarçados de cordeiros papando tudo aquilo que deveria ser de todos, devoravam tudo... 

Mas que tragédia! Não é que, no meio da confusão, aparece um animal chamado homo-sapiens o mais malvado de todos os bichos... Terrificada pelo cheiro nauseabundo do bípede erecto, a bicharada em pânico, em uníssono gritou: SALVE-SE QUEM PUDER!!!

sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

[0041] Tchalé Figueira, mais um conto

TCHALÉ FIGUEIRA, Mindelo, São Vicente de Cabo Verde, 1953
Multifacetado (pintor, escritor e músico), Tchalé Figueira larga a sua invenção a partir de Cabo Verde até onde a nave da sua imaginação chega no perdido universo.


LIÇÃO DE HISTÓRIA GALÁCTICA NO PLANETA z525vipkx

Bem perto das coisas reais, autonomia ou medo na existência de sermos nós. Fosse pela imortalidade, quiçá valesse a pena vender a alma a deus ou ao diabo, mas tudo é ficção e teologia o que é? No planeta Terra, um menos doido que compreendeu  que os idiotas para existirem na sua miséria existencial precisavam de consolo, fez com que a maioria dos humanos acreditasse na vida eterna, no paraíso e na maldade do eterno sofrimento no fogo do inferno. As estrelas do infinito universo existem vivem e morrem, a poeira cósmica existe neste caldeirão que é  a via láctea movimentando-se em espiral... 

Há milhões de anos, uma vez apareceu, igual a uma esfera ínfima, um planeta chamado Terra. Fantástico! Numa coincidência quântica no caldeirão de sopa cósmica  nasceu o planeta e, após uma evolução de bilhões de anos, foi por aí, crescendo... Numa natural evolução biológica, apareceu vida e durante bilhões de anos esta vida foi evoluindo até chegar a um animal estranho, um símio, um macaco primitivo, que muito, muito mais tarde,  chamaram os antropólogos daquele planeta de Luci... Milhares de anos depois reproduziu-se  um homem Habilis e... muito, mas muito, muito, mas muito mais tarde, o macaco tornou-se falante e gramático, chamou-se a si próprio de Homem... 
Esta interessante criatura que na sua evolução escreveu umas coisas chamado livros, inventou também a palavra humanidade, filosofia que significava "amigo da sabedoria" mas algo nele estava errado. Ele era uma falha de construção...  

Foi este mesmo macaco humano que, apesar de ter criado  coisas bonitas como a poesia, arte, etc, tinha infelizmente algo de ignóbil e reptiliano, destrutivo e um medo primário que ficou no seu cérebro, algo que um macaco da sua espécie chamado Freud, um humano mais inteligente, chamou de subconsciente... Naquele cérebro complexo, os humanos depositavam, entre outras belezas, coisas horríveis não resolvidas que habilmente escondiam, eram maldades mortíferas...

Vivendo com fantasmas não resolvidos durante milhares de anos, os símios gramáticos lutaram uns contra os outros, inventaram algo que chamaram de política, eram vaidosos, adoravam o poder, eram gananciosos  de coisas absurdas, incompreensíveis aqui no nosso planeta. Durante a sua curta existência, lutaram uns contra os outros sem parar...  Mesmo assim, estranhamente, conseguiram evoluir com uma certa tecnologia primitiva e, após séculos e mais séculos crescendo a que intitularam de evolução, inventaram para a sua desgraça o conceito de raça que foi mais um dos muitos desastres na sua efémera existência !!!... 

Desculpem-me meninos deste nosso planeta z525vipx utopia, aqui na via láctea. A história do planeta Terra foi catastrófica... Poderia continuar a contar  a história da Terra que em tempos existiu aqui na nossa via láctea mas já é tarde, tenho que ir descansar... Para terminar, resta acrescentar o seguinte... Em distúrbios mentais e jactâncias, criaram aquilo que chamavam de pátria, bandeiras, hinos e exércitos. O pior foi ao inventaram a mortífera bomba feita de átomos a que chamaram de bomba atómica... Numa das suas absurdas guerras, um dia, carregando em botões, fizeram explodir aquilo que foi o seu planeta e é hoje na via láctea um montão de escombros rodando na imensidão do universo...

Coitados dos terrestres, meninos! Por serem um erro biológico desde a sua génese, morreram todos. É esta a triste história do planeta dos humanos. 

quarta-feira, 26 de dezembro de 2018

[0029] Tchalé Figueira, mais um conto

TCHALÉ FIGUEIRA, Mindelo, São Vicente de Cabo Verde, 1953
De Cabo Verde, Tchalé Figueira envia-nos mais um conto tecido nas horas em que se liberta do seu cavalete e da sua pintura 


OS MORTOS NÃO CHORAM

Já não tinha alfinetes para cravar na mente, foi à drogaria mais perto da sua casa e sem prescrição comprou duas garrafas de Bourbon falso feito de restos de pilhas de uma lixeira do bairro chineses. Tudo nele era descrédito e desolação, podia até beber urânio empobrecido, longe de alcançar aquilo que desejava. Tinha falhado em cinco matrimónios, tinha gasto milhares de dólares com psiquiatras e bruxos... bebeu incontáveis mixórdias e até esteve em Santo Antão, em Cabo Verde, umas ilhotas no meio do Atlântico, a 500 Km do continente africano, onde um famoso bruxo curava com pénis de tartaruga e grogue de arruda benzido pelo cardeal católico, a impotência.

Foto NG
Tentou tudo, mas nada funcionou. Desolado, regressou a Baltimore onde morava na sua enorme mansão. Com o tempo, sem solução para a sua miserável vida, vendeu tudo e foi para Calcutá e dali viajou atravessando a Índia. Miserável e feito um pária igual aos intocáveis, depois de longos anos chegou exausto a Benare onde viu piras com cadáveres queimando. Arrastando os pés, chegou às escadas banhadas pelo Ganges e num degrau da escada deitou-se… 

Com todo o peso do mundo em seu corpo, dormiu, pensando que estava sonhando viu o seu corpo numa pira ardendo. Não era sonho não! Aliviado soube que tinha morrido. Quis chorar, mas os mortos não choram.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2018

[0021] Tchalé Figueira, um viajante de mundos e um conto vindo de Cabo Verde

TCHALÉ FIGUEIRA, Mindelo, São Vicente de Cabo Verde, 1953
Na sua juventude, Tchalé correu mundos e teve mil ofícios. A bordo de um navio, conheceu povos diversos e colheu diferentes experiências. O presente conto é delas herdeiro.


NO DESERTO DE SANOKY

No deserto de Sanoky, entre o céu e um sol vindo das forjas do inferno, um forte cilíndrico e as suas guaritas direcionadas  para os quatro pontos cardeais.  Quatro bandeiras esfarrapadas bailam em mastros corrompidos pela intempérie, redemoinhos bailam num canto de ensandecer, vozes do vento numa constante vem de nenhures. Tudo é sonho ou fantasmas de sonhos na desoladora paisagem. Quatro guerreiros nervosos, esperam a vinda dos Atalampos, que, segundo uma lenda, vivem nas estepes onde existem rios, agro verde e animais de caça. Terra de valorosos guerreiros, temíveis,  de grandes espadas, sempre trajados com peles de animais e chifres de veados ornando as suas cabeças.

Um cão selvagem cor de areia corre atrás da sua sombra, no zénite deste dia o horizonte tremeluza e, os quatro guerreiros, apreensivos, aguardam um mito... (ou será verdade?) A terra vermelha num suplício voa em todas as direções, o tempo pára, os quatro homens nervosos nas guaritas escutam o rumor do vento e o bater dos seus corações. Faz hoje trinta dias e trinta noites que aguardam, esperam ser rendidos por soldados do seu exército que virão  dos confins da cidade das areias mágicas, Kalugame, onde mora o seu povo, os Fulangene, inimigos mortais dos Atalampos. 

No limiar da loucura, os vigias esperam... Rendição ou o inimigo? Qual deles chegará primeiro?

Como se de um milagre tratasse,  o azul do imenso deserto de repente abre-se, o vento pára, a poeira assenta, na guarita direcionada para o oriente um dos soldados avista no horizonte tremeluzindo, espectros de pessoas em montadas aproximando-se, que vão crescendo gradualmente. Serão Atalampos? Serão Fulangene? 

Agarrando na corda de um velho sino, no teto do cubículo, o homem da guarita do oriente, nervoso, começa a badalar o sino, alerta seus companheiros pasmados, que subitamente, acordam do seu torpor.

Aproximando-se cada vez mais do forte, o soldado nota que os cavaleiros montados em robustos cavalos têm ornamentos nas cabeças, chifres de veados, um gosto amargo. A morte começa a descer lentamente pela sua traqueia.